20 ANOS A PROCURAR ENTENDER A EPIDEMIOLOGIA DA MALÁRIA NA MANHIÇA
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20 ANOS A PROCURAR ENTENDER A EPIDEMIOLOGIA DA MALÁRIA NA MANHIÇA


Técnico do Laboratório de Insetário, Celso Melembe, no processo de criação de mosquitos

Uma análise dos dados de vigilância da malária nos últimos 20 anos, demonstra uma evolução epidemiológica da doença no Hospital Distrital de Manhiça.


Estimar o peso da malária e da mortalidade nos países endémicos, é um desafio para a maioria, devido à fraqueza dos seus sistemas nacionais de informação de saúde. Por conseguinte, estas estimativas baseiam-se frequentemente em modelos que utilizam dados de prevalência. O Centro de Investigação Sanitária da Manhiça (CISM) apoiado pelos governos de Moçambique e da Espanha, e o Instituto de Saúde Global de Barcelona (ISGlobal), um centro apoiado pela Fundação "la Caixa", acabam de publicar uma análise retrospectiva dos dados de vigilância longitudinal da malária nos últimos 20 anos. A análise baseia-se nas consultas de malária no Hospital Distrital de Manhiça, província de Maputo, sul de Moçambique. Esta análise, aprofunda e ajuda a compreender a relação entre a intensidade da transmissão da malária, o peso e a apresentação clínica da manifestação grave da doença.


O artigo publicado na revista The Lancet Global Health, analisa dados de vigilância hospitalar sobre todas as crianças menores de 15 anos admitidas no Hospital Distrital de Manhiça entre 1 de Julho de 1997 e 30 de Junho de 2017. Durante este período, 32.138 crianças foram atendidas no hospital com diagnóstico de malária, representando 51% do total dos atendimentos. A malária representou em 1998, 37% dos atendimentos, atingiu um pico de 77% em 2001 e depois diminuiu gradualmente até atingir o seu nível mais baixo de 27% em 2011, flutuando posteriormente. Desde o ano 2000, o número de internamentos pela doença e o número de mortes causadas pela doença têm ambos registado uma tendência decrescente.


No artigo, os autores descrevem como o padrão etário dos pacientes com a malária muda ao longo do tempo para idades mais avançadas. Nos primeiros 12 anos do estudo, as crianças com 5 anos ou mais representavam 10% dos doentes com malária, mas nos últimos 4 anos, este número aumentou para cerca de 30%. A idade média das pessoas que morreram da doença também aumentou durante o mesmo período, embora a maioria das mortes continuem a ocorrer em crianças menores de 5 anos de idade.

O estudo mostra também a alteração na apresentação clínica da malária grave, com um aumento da malária cerebral e uma diminuição da anemia grave e dos problemas respiratórios. As taxas de mortalidade por malária grave variaram de 1,1% (2014-2015) a 7,2% (2010-2011), diferindo por síndrome de malária grave: 3,3% para anemia grave, 5,1% para problemas respiratórios e 14,8% para malária cerebral.


"O declínio na transmissão da malária no distrito de Manhiça nas últimas duas décadas foi acompanhado por um rítmo mais lento de aquisição de imunidade natural contra a doença. Isto levou a uma mudança no padrão etário da doença para idades mais avançadas, o que, por sua vez, resultou em menos admissões e mortes, apesar de a percentagem de doentes com malária grave ter aumentado. Portanto, embora devemos continuar a dar prioridade às crianças com menos de 5 anos, que ainda são o grupo mais afectado pela doença, os programas de controlo devem também alcançar crianças mais velhas" comentou a investigadora do ISGlobal Caterina Guinovart, principal autora do estudo.


Actualmente, a implementação de medidas de controlo da malaria é na sua maioria, informada por dados de prevalência, em detrimento dos dados clínicos. Este estudo mostra que os dados hospitalares são uma fonte de informação útil para melhor compreender as prioridades e os grupos de alto risco, bem como para informar as políticas de saúde. Neste sentido, Francisco Saúte, co-autor do artigo e Director Geral do Centro, afirma que análises desta natureza mostram a importância dos dados gerados pelas nossas plataformas de vigilância demográfica e de morbilidade, e que as suas conclusões irão permitir informar aos Serviços Distritais de Saúde Mulher e Acção Social e desta forma melhorar a assistência sanitária no distrito especificamente no combate a malária.


Referência

  • Guinovart C, Sigaúque B, Bassat Q, Loscertales MP, Nhampossa T, Acácio S, Machevo S, Maculuve S, Bambo G, Mucavele H, Soriano-Gabarró M, Saifodine A, Nhacolo A, Nhalungo D, Sacoor C, Saúte F, Aponte JJ, Menéndez C, Macete E, Alonso PL. The epidemiology of severe malaria at Manhiça District Hospital, Mozambique: a retrospective analysis of 20 years of malaria admissions surveillance data. Lancet Glob Health. 2022 Jun;10(6):e873-e881. doi: 10.1016/S2214-109X(22)00125-5


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